O aluno de hoje: o profissional de amanhã
A notícia é esta: acadêmica do curso de medicina da USP comete apropriação indébita de quase R$ 1 milhão, em face dos colegas de aula. Integrante da comissão de formatura da turma, perdeu a oportunidade de demonstrar a própria idoneidade, confirmando a percepção social oposta a isto. Se a protagonista do triste episódio faz isso […]
Por Israel Minikovsky 11 min de leitura
A notícia é esta: acadêmica do curso de medicina da USP comete apropriação indébita de quase R$ 1 milhão, em face dos colegas de aula. Integrante da comissão de formatura da turma, perdeu a oportunidade de demonstrar a própria idoneidade, confirmando a percepção social oposta a isto. Se a protagonista do triste episódio faz isso contra os colegas, com quem mantém relação de horizontalidade – os quais presumo serem pessoas mui ilustradas, do que a admissão ao curso em questão é o espelho de burilada proficiência – fico a imaginar o que essa figura não faria em desfavor de seus potenciais pacientes, na condição de vulnerabilidade ou hipossuficiência. Penso que deveríamos imitar o Japão, neste ponto. Os dois primeiros anos do fundamental deveriam ser empregados quase que exclusivamente à formação do caráter e à aquisição de valores morais, em acordo com o que preconiza a ética mais rigorosa. Porque sendo a ética algo mais amplo, essa consciência deveria induzir o estudante à compreensão de que, também é dever do aspirante ao jaleco branco, dedicar-se o suficiente aos estudos, visando a evitação de erros decorrentes de imperícia profissional. O vestibular é um bom critério de admissão ao ensino superior, desde que o pensamento lógico entra como pressuposto para a própria consciência moral. Todavia, ele não é absoluto como critério. Quiçá, dos males que essa tal poderia causar, este foi o de menor alcance. Afinal, não há dinheiro que valha mais que uma vida. Se o amável leitor já testemunhou um especialista em ciências da natureza debochando do status científico das ciências sociais, este é um magnífico exemplo de para que servem as humanidades e a falta que elas fazem. Hoje tem médico participando de reality show, tem médica modelo, tem médico que não exerceu sua profissão por ao menos um dia e, entrando para a política, se apresenta como o candidato “Dr. Fulano de tal”. Sendo, para boa parte da sociedade brasileira, o curso de medicina, o de maior brio, urge que abandonemos essa visão bacharelesca, a fim de que essa onerosa formação se converta em bem-estar da coletividade. Não defendo que um profissional da medicina não possa desenvolver outras atividades, como por exemplo, ginástica, docência, carreira política, escritor, palestrante, etc. Mas o diploma não deve ser convertido num rótulo, num adorno, num penduricalho. Década e meia de advocacia me mostrou o real significado do exercício de uma profissão. Creio que esse efeito se faz sentir também nas profissões ligadas à saúde humana. Um diploma em direito ou em medicina sem efetivo exercício profissional é como uma Ferrari 0 Km que fica por longo período sujeita à ação da inércia e suas consequências, numa escura garagem. Pobres pais ou familiares que investiram tanto dinheiro e esforços, para dar no que deu. No passado muito mais, no entanto, ainda hoje esta é uma verdade, cursos de direito e medicina, não formam apenas advogados, juízes, promotores, etc, e médicos, respectivamente, eles formam liderança sociais. E a universidade deve estar preparada para isto e acompanhar de perto estes estudantes. Ética é luz!