Junho: um mês verde e vermelho
A Lei n. 14.393/2022 institui a Campanha Junho Verde. A mencionada iniciativa legal teve como ponto de partida o acatamento de uma proposta advinda da presidência da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Não só o clero católico brasileiro se preocupa e se envolve com esse relevante assunto, senão a Igreja como um todo, […]
Por Israel Minikovsky 16 min de leitura
A Lei n. 14.393/2022 institui a Campanha Junho Verde. A mencionada iniciativa legal teve como ponto de partida o acatamento de uma proposta advinda da presidência da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Não só o clero católico brasileiro se preocupa e se envolve com esse relevante assunto, senão a Igreja como um todo, como instituição internacional. Quem aprecia a doutrina emanada do magistério da Igreja pode saborear a encíclica Laudato si. Deveras, a noção de uma “casa comum” tem farto amparo bíblico escriturístico. A crise climática planetária é um dos sintomas de que o organismo que habitamos, a terra, está passando por algum desconforto ou estresse. Deus nos outorgou domínio sobre a natureza, mas fez isto nos equipando de discernimento, para que o façamos de modo inteligente. A espiritualidade franciscana nos remete para a verdade de que, como criaturas, todos somos irmãos. Daí a conveniência de se falar no irmão Sol, na irmã Lua, no irmão rio, na irmã montanha, na irmã flor, no irmão pássaro. E o nosso estatuto ôntico, consistente na filiação, traz consigo não só uma prerrogativa, senão mais que isso, uma responsabilidade maior. Sim, somos responsáveis por nós próprios e pelas outras espécies que partilham conosco este espaço. As demais espécies são produtos e vítimas do ambiente, estão destituídas de ação consciente e intencional. Nós, seres humanos, diferentemente, temos a chance de imprimir sobre o meio a ingerência com retorno planejado e calculado. Jamais podemos perder de vista esta nossa peculiaridade. Fosse pouco ser junho o mês dedicado à reflexão sobre meio ambiente e ecologismo, ele foi precedido por catástrofes em território brasileiro e em várias partes do mundo. Cuidando da biosfera, estaremos adiando o fim do mundo, para usar uma expressão de Krenak, mas ainda, evitando condições extremas que prejudicam enormemente a economia da comunidade e a perfectibilização dos seus ciclos. Para quem só entende a linguagem do dinheiro, o argumento aí está, sob medida, customizado. O nosso calendário, todo ele, foi colorido. Cada mês tem uma cor. Em sua maioria, as tais cores nos alertam para esta ou para aquela circunstância que pode impactar nossa saúde. Eu acredito que com o verde não é diferente: podemos nós fomentar alguma esperança de saúde, prescindindo da preservação das áreas verdes? Sem embargo, junho ainda ostenta uma segunda cor, essa mais quente, o vermelho. O estabelecimento desse critério crômico nos remete para a suma importância de haver voluntários que doem o próprio sangue para abastecer os bancos de hematologia. Eu penso que não poderia haver dobrada mais sugestiva do que esta: aposto que a clorofila presente na minha salada se transforma em hemácias. Por conseguinte, o cuidado que tenho com a terra, com sua fauna e flora, é o lado de uma mesma realidade, o cuidado que devo dispensar ao ser humano, que está em mim mesmo, que está no outro. Calha que nossos intelectuais sejam ecoteólogos, socioteólogos. Porque o amor de Deus se concretiza no respeito à Criação, donde extraímos mais que matérias-primas, a sustância de tudo o que a nossa existência implica. Ele também se manifesta na ternura maternal e nas amizades que consolidamos ao longo de nossa trajetória. A ideia central é de harmonia. Zelar pelo chão que pisamos, pela água que bebemos, pelo ar que respiramos, pelo próximo que de mim depende e que me completa naquilo que não é o meu quefazer. As duas cores da calenda de agora parecem abranger toda a palheta. Pela abrangência de tudo o que elas representam. O junino desafio temático não colima outra meta senão desenvolver em nós o valor pela vida, seu sentido, seu propósito. A felicidade é olhar para a própria conduta e, ver nela, a realização de uma responsabilidade, saber que o que lhe cabia foi honrado, adimplido. E todos estes valores urgem que sejam inculcados nas gerações vindouras. Assim sendo, a nossa vida é isso, um contínuo fazer e refazer. Aprender e reaprender. Começar do zero e avançar. O gênio, que decidiu pintar cada folha do calendário com uma cor, nasceu tarde. Deveríamos ter tomado essa iniciativa muito antes. A nossa existência é avassalada pelo tempo kronos, e fica estupefata e vislumbrada com o tempo aión. Contudo, é o tempo kairós que atribui significado aos nossos dias. Junho é um mês de muita luz, se é!