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Silvio Santos e nós

Senor Abravanel (1930-2024), vulgo Silvio Santos, deixou-nos dias atrás. A trajetória desta personalidade se confunde com a história da televisão. Ex-global, notabilizou-se por fazer do SBT o canal dono do segundo lugar. Vendeu o canal Record para Edir Macedo. Descendente do ilustre filósofo e financista Yitzchak ben Yehuda Abravanel (1437-1508), peça-chave para desencadear o que, […]

Por Israel Minikovsky 15 min de leitura

Senor Abravanel (1930-2024), vulgo Silvio Santos, deixou-nos dias atrás. A trajetória desta personalidade se confunde com a história da televisão. Ex-global, notabilizou-se por fazer do SBT o canal dono do segundo lugar. Vendeu o canal Record para Edir Macedo. Descendente do ilustre filósofo e financista Yitzchak ben Yehuda Abravanel (1437-1508), peça-chave para desencadear o que, à época, poderia ser chamado de “projeto Brasil”, Senor não negou a tradição familiar marcada pelo empreendedorismo. Mais que um comunicador, foi o artífice de um império econômico. Nesses dias também vimos o passamento de Antônio Delfim Netto (1928-2024). Houve quem colocasse Senor Abravanel e Delfim Netto dentro do mesmo conjunto, ambos “funcionários da ditadura”. Ora, Max Weber afirma que a sociedade capitalista ou burguesa é um processo de desencantamento em relação ao padrão social anterior. A esperança em Deus, em grande medida, é substituída pela noção de trabalho e dever. Com a crítica marxista ao capitalismo, é denunciada a situação de exploração, delimitada pela categoria de mais-valia, é delatada a condição de alienação do trabalhador. Nesse viés, sob a ótica do materialismo histórico, os meios de comunicação social exerceriam a função de superestrutura ou legitimação ideológica do sistema. Louis Althusser (1918-1990) lista os meios de comunicação social como alguns dos importantes elementos dentre os aparelhos ideológicos de chancelamento ao sistema. Ora, essa discussão vai longe. Se você nasce numa sociedade capitalista, logo percebe que é mais fácil atuar segundo as regras ali vigentes, acatando-se, digamos, “as regras do jogo”. Não há dúvida de que gerações passaram intermináveis domingos, à frente da telinha, com o apresentador aqui referido. Então surge o dilema: o que é melhor, um feliz alienado, ou um consciente aborrecido? Eu penso que, numa situação como essa, é melhor suspender discussões dessa espécie e focar na personalidade. Até quem não gosta de Karl Marx (1818-1883), ou de suas teorias, ficaria encantado com o seu carisma. Todos que o conheciam ou que eram próximos a ele teciam comentários elogiosos. Gostava de crianças, tinha uma boa conversa, era amoroso com a esposa e com as filhas. Os genros o descreveram da melhor forma possível. Senor Abravanel deixa muitas saudades e raros ressentimentos. Estes últimos, aliás, mais ligados a ideias ou valores do que a uma eventual inimizade pessoal. Silvio Santos, como preferiu ser chamado, com o objetivo de pavimentar sua popularidade, é um orgulho para o Brasil, em dois sentidos. Em primeiro lugar, pelo exemplo legado, e, segundamente, porque aqui nesta terra ele pôde encontrar as condições necessárias para tornar-se quem efetivamente se tornou. Silvio Santos nos relegou a fórmula do sucesso: tino comercial, trabalho sério e relacionamento. Nenhuma empreitada é bem-sucedida sem uma comunicação eficiente. O fato de ter vendido a Record para o representante maior da Igreja Universal do Reino de Deus, Edir Macedo, deve-se ao fato de o neopentecostalismo ser, em boa medida, em meu ponto de vista, judaizante. O pastor quase sempre prega a partir de um texto do Antigo Testamento, e quando toma passagens do Novo Testamento, pinça de Atos dos Apóstolos ou de algumas das epístolas. Diferente do padre católico que sempre procura priorizar o Evangelho. Dizem que o judeu manda no mundo pelo dinheiro e pela mídia. Quem quer que tenha o governo do mundo, fato é que o mundo precisa do governo. Se, pois, de uma forma ou de outra sempre seremos persuadidos ou dissuadidos, que seja por uma maneira suave. Nós, os sedizentes cristãos, fomos alertados por um judeu acerca de como devemos tratar o nosso próximo: com amabilidade, carisma, simpatia, atenção, simplicidade, etc. Deus permita que a Terra de Santa Cruz continue parindo Miltons Santos, Pelés, Getúlios Vargas, Césares Lattes, Chacrinhas, Madres Paulinas, Silvios Santos. Senor Abravanel correu a boa corrida. Corramos, nós, a nossa. Como resume o clichê: a única coisa que levamos da vida é a vida que se leva. Senor Abravanel foi uma pessoa iluminada, sem dúvida!