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Crime Organizado e Delação Premiada

Em 09 de maio de 2024, às 19h15min, no auditório da Univille, São Bento do Sul recebeu o desembargador Júlio César Machado Ferreira de Melo, que proferiu a palestra cujo tema serve de cabeçalho a este artigo. A delação premiada é um instituto jurídico de vetusta idade, o livro V das Ordenações Filipinas, que entrou […]

Por Israel Minikovsky 18 min de leitura

Em 09 de maio de 2024, às 19h15min, no auditório da Univille, São Bento do Sul recebeu o desembargador Júlio César Machado Ferreira de Melo, que proferiu a palestra cujo tema serve de cabeçalho a este artigo. A delação premiada é um instituto jurídico de vetusta idade, o livro V das Ordenações Filipinas, que entrou em vigor em 1603, faz alusão a ele, prevendo punições bárbaras como pena de morte e degredo. Recentemente, outros diplomas legais têm recepcionado a delação premiada: a Lei n. 8.072/1990, no artigo 8º prevê: “Art. 8º Será de três a seis anos de reclusão a pena prevista no art. 288 do Código Penal, quando se tratar de crimes hediondos, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins ou terrorismo. Parágrafo único. O participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços”. A Lei n. 9.269/1996 estipula: “Art. 1º O § 4º do art. 159 do Código Penal passa a vigorar com a seguinte redação: ‘Art. 159. § 4º Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do sequestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços’”. A Lei n. 9.807/1999 visa a proteger vítimas e testemunhas ameaçadas, bem como preconiza beneficiar quem colabora com a investigação. Nela há previsão de perdão judicial a quem é réu primário e redução de pena para quem não é primário. A Lei n. 11.343/2006, conhecida como Lei Antidrogas, institui que: “Art. 41. O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais coautores ou partícipes do crime e na recuperação total ou parcial do produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um terço a dois terços”. A Lei n. 12.850/2013, que regulamenta e organiza conceitos úteis ao combate a organizações criminosas, em seu artigo 3º A, reza que: “Art. 3º-A. O acordo de colaboração premiada é negócio jurídico processual e meio de obtenção de prova, que pressupõe utilidade e interesse públicos”. Essa legislação entrou em vigência a partir da realidade da internacionalização do crime organizado. Alguns crimes ultrapassam fronteiras, como a prostituição e o tráfico de drogas. Há um empenho em fazer Portugal e Espanha aderirem à colaboração das polícias internacionais e equiparar sua legislação ao direito estrangeiro homólogo. Existem requisitos a serem observados aquando da concessão da delação premiada. A colaboração pode, inclusive, ser concedida após a sentença. Existe a possibilidade de reinquirição do colaborador, facultando-se-lhe a retratação. Celebrada a colaboração, ela deve ser homologada pelo magistrado. A depender do nível de sigilo, por exemplo, nível 5, nem a defesa tem acesso à investigação e à pré-instrução. Cabe ao juiz, ainda, precisar os termos do acordo e explicitar sua eficácia. Aqui entra o livre convencimento do juiz, devidamente fundamentado no ordenamento jurídico. Quem, ao delatar, mente, comete crime de denunciação caluniosa. O proponente da colaboração é o Ministério Público. A delação premiada, para clareamento conceitual, é um contrato. Já nos finalmentes, o palestrante afirmou que o PCC é uma das maiores máfias do mundo, estando presente praticamente em todas as partes do globo. A aludida organização criminosa teria conseguido se infiltrar inclusive em órgãos de proteção e de segurança. Aberta a palavra para perguntas, formulei três delas. A primeira: consoante aprendemos em direito penal e direito processual penal, numa ação penal pública incondicionada, for instance, o perdão da vítima não obsta a prossecução da ação, por se tratar de interesse público. Logo, a delação premiada poderia estar transigindo sobre interesse público, por definição indisponível. Ao que o palestrante respondeu que a discussão ascendeu aos tribunais superiores e, aliunde, decidiu-se que o negócio processual não fere o interesse público, antes, o reforça. A segunda: o que o legislador refere à possibilidade de haver oportunismo, no sentido de um acusado forjar uma assertiva verossimilhante e plausível, em harmonia com o conjunto probatório, auferindo imerecido benefício e lesando a outrem? Ao que se nos foi respondido que, em tal situação, se aplica ao sicofanta a mesma regra cabível à testemunha. Terceira e última pergunta: se a delação pode suceder a prolação da sentença, abre-se a possibilidade de flexibilizar o princípio da sentença transitada em julgado, o que pode redundar em reformatio in pejus para o delatado, acarretando insegurança jurídica. Ao que se nos redarguiu que, em tal contexto, é caso de ofertar nova denúncia, apurando fato novo, mantendo incólume a decisão anterior. Em síntese, essa foi a lição transmitida pelo festejado jurista, aos acadêmicos, ex-acadêmicos, advogados e demais membros da comunidade jurídica são-bentense.