Justiça Social Imobiliária
No dia 26 de setembro de 2023, das 19h às 20h30min, ocorreu a palestra “Justiça Social Imobiliária: voltada para condomínios de baixa renda”, na modalidade on-line. A entidade ofertante do módulo foi a OAB Federal. O mediador foi o professor Rodrigo Karpat, ao passo que como palestrante figurou o (também) professor Durval Salge Jr. O […]
Por Israel Minikovsky 29 min de leitura
No dia 26 de setembro de 2023, das 19h às 20h30min, ocorreu a palestra “Justiça Social Imobiliária: voltada para condomínios de baixa renda”, na modalidade on-line. A entidade ofertante do módulo foi a OAB Federal. O mediador foi o professor Rodrigo Karpat, ao passo que como palestrante figurou o (também) professor Durval Salge Jr. O mediador informou os participantes do evento de que uma pesquisa promovida em 2019, pela Fundação João Pinheiro, teria apontado para a grandeza de 5,8 milhões de habitações faltantes em nosso país. Não raro, a transferência de propriedade esbarra em empecilhos jurídicos e econômicos consistentes em emolumentos. Recorrentemente, o cidadão não consegue ingressar num programa habitacional por não dar conta de comprovar sua condição de baixa renda. Dada a palavra ao palestrante, ele pontuou que, em obra de sua autoria, o ministro Alexandre de Moraes defende a ideia de que a cidadania dá ao indivíduo o status de ser humano. E a cidadania inclui a moradia. O artigo primeiro da Constituição Federal coloca como fundamentos da República a cidadania e a dignidade da pessoa humana. De acordo com o Ministério das Cidades, de todas as pessoas que vivem em países em desenvolvimento, de 40 a 70% moram em imóveis informalmente. No Brasil, 100 milhões de pessoas residem em imóveis irregulares. O artigo terceiro da Constituição Federal coloca como objetivos da República reduzir as desigualdades sociais entre os cidadãos. A Carta Magna assegura a inviolabilidade do domicílio. O domicílio é a única oposição ao caos. A identidade do homem é domiciliar. Faz toda diferença estar fora ou recolhido no seu domicílio. Schopenhauer, citando Epicuro, diz que existem três grandes necessidades humanas. No primeiro nível, em que se encontram as chamadas necessidades naturais e obrigatórias, temos a alimentação, o vestuário e a moradia. Tomás de Aquino diz que a função suprema do Estado é assegurar o bem-estar à coletividade. E este princípio só se cumpre desde que inclua em si mesmo a garantia da habitação. Nós temos a “cidade informal”, que é o jargão que se aplica aos assentamentos que não aparecem nos documentos públicos. Dentro do direito à habitação existe o chamado “direito de laje”, que é a concessão do espaço tridimensional, para fins de edificação, a partir da laje de um imóvel, em sentido ascendente. Assunto da maior importância dentro do direito imobiliário é a regularização imobiliária brasileira. Os condomínios de baixa renda começam a encontrar sua viabilidade econômica a partir dos financiamentos concedidos pelos institutos previdenciários como IAPI – Instituto de Aposentados e Pensionistas da Indústria e IAPETEC – Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Empregados em Transportes e Cargas. Estes institutos precederam o BNH – Banco Nacional de Habitação. O programa hoje em vigência na mesma linha é o Minha Casa, Minha Vida. O primeiro condomínio de grandes blocos com perfil popular foi o “Le Corbusier”, edificado na França em 1951. Alguns aglomerados em São Paulo, por exemplo, são verdadeiras cidades dentro da cidade. A média é de 196 apartamentos. Mas alguns condomínios passam longe dos 500 apartamentos. O PAR – Programa de Arrendamento Residencial faz jus ao nome: pagam-se parcelas equivalentes ao preço de aluguel, e após o prazo de 15 anos o locatário obtém a titularidade do imóvel, como se tivesse quitado a última parcela de um financiamento. Os países socialistas foram os primeiros a investir em condomínios de grandes blocos para pessoas de baixa renda. Embora esta ideia de Estado seja bem intencionada, o que se constata é que condomínios de grandes blocos geram grandes problemas. Por uma razão muito simples, o direito de vizinhança é assoberbado à exata medida que os conflitos surgem em escala numérica elevada. Em São Paulo há o CDH – Contrato para o Desenvolvimento de Habitação, a HIS – Habitação de Interesse Social e a COHAB – Companhia Metropolitana de Habitação de São Paulo. Frise-se que os condomínios de grandes blocos podem variar no padrão, deslocando-se do baixo nível, passando ao nível médio e até alto nível. Existe forte concorrência entre empresas que administram condomínios. Startups de tecnologia vendem aplicativos para as referidas empresas, com a meta de facilitar a gestão dos espaços condominiais. O que vemos, é que condomínios de grandes blocos estão sendo abandonados. Por qual motivo? Não parece ser por uma questão econômica. Pois o custo já é concebido para poder ser suportado por pessoas de baixa renda. Os motivos são vários. Entre eles está o fato de que essas edificações ficam distantes do centro da cidade. Aliada a esta circunstância, existe a dificuldade de deslocamento, pois o transporte público não é adequado. Ainda nessa linha, existe a falta de equipamentos públicos. Desde áreas de lazer, como parques, quadras, piscina, até a ausência de escolas. Falta inclusive segurança. Arquitetos e engenheiros formados recentemente já estão contemplando estes itens em seus projetos. A lógica seria repartir as 24 horas do dia em três frações: 8 horas para trabalhar, 8 horas para lazer e 8 horas para descansar. Então as horas in itineris rompem com essa lógica. A questão da moradia é mais do que um instituto jurídico ou um deleite filosófico. No passado, ser partícipe do programa impedia a venda. (Para evitar que a pessoa vendesse o primeiro imóvel, levantasse dinheiro com a alienação, e voltasse para o programa para ser novamente contemplado). Contudo, o proibitório gerou a ocupação irregular. Muitas unidades abandonadas são invadidas. Pessoas do tráfico de drogas, não raro, ocupam estes espaços. Isto é problemático, porque o poder paralelo anula o poder do síndico. O condomínio é uma fração da grande sociedade. Existe diferença jurídica e de fato entre associação e condomínio edilício, o que foi noticiado, sem ter recebido tratamento pormenorizado pelo painelista. Existe alguma frequência no fato social tipificado pela lei penal como apropriação indébita, protagonizado pelas empresas condominiais. Alternativa jurídica que se ventilou e vem sendo praticada é esta: trabalhar com o usufruto vitalício, isto é, o imóvel pertence ao Estado, e o beneficiado não tem relação de propriedade, mas meramente de posse. Em tais situações, às vezes, o condomínio já é irregular na nascença. É um método de contornar a questão da regularidade jurídica. Nós temos institutos processuais, como a usucapião e a adjudicação compulsória, que se prestam a institutos de regularização imobiliária. A falta de manutenção preventiva e corretiva, mais a má gestão, redundam na desvalorização do bloco condominial. O risco pode morar ao lado: o prédio vizinho pode não ter laudo, com problemas vários, como sistema de gás fora dos padrões técnicos. A REURB, que é o conjunto de medidas sociais, jurídicas, urbanísticas, ambientais, voltadas à organização do espaço urbano, mostra que cada cidade tem uma visão diferente sobre o assunto. Existem municípios que são proativos, eles fazem busca ativa do irregular para que seja regularizado. Os condomínios têm várias obrigações, inclusive fiscais e parafiscais. Disso nasce a necessidade de se ter um CNPJ próprio. É inviável que cada bloco tenha seu próprio síndico. Como fazer a quotização? Existe a figura central e o subsíndico. É necessário que haja uma conta para receita e despesa para cada bloco. Daqui surgem problemas de contabilidade. No Livro 3 acha-se uma célula para abrigar um ente uno, mas a verdade é que ali estão abarcados vários blocos. Trata-se, pois, de uma irrealidade. Não se retrata a realidade em sua objetividade. Nos casos de inadimplemento, o imóvel volta para a Caixa Econômica Federal, que é o órgão financiador, e são realocados outros participantes do programa que ainda não foram contemplados. Alguma semelhança com “A Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra” (1845) de Friedrich Engels?