Marxismo: socialismo “científico”?
O século XIX foi áureo para os cientificistas. Desde novas religiões, até agitadores sociais e suas ideologias, quiseram se cingir da veneranda cientificidade. O que é, afinal, o marxismo? Faço essa pergunta, porque compreendo que, o mês de maio é aquele em que não só se consagra um dia à memória da importância do trabalho, […]
Por Israel Minikovsky 14 min de leitura
O século XIX foi áureo para os cientificistas. Desde novas religiões, até agitadores sociais e suas ideologias, quiseram se cingir da veneranda cientificidade. O que é, afinal, o marxismo? Faço essa pergunta, porque compreendo que, o mês de maio é aquele em que não só se consagra um dia à memória da importância do trabalho, senão que, toda esta calenda, deve render reflexões respeitantes a esta fundamental dimensão da nossa existência. Em linhas gerais, o marxismo é filosofia, sociologia, história e economia. Ora, as últimas três disciplinas mencionadas são, indiscutivelmente, ciência. Já a filosofia, não é uma ciência, é um saber. Como a ciência, também, é um tipo de saber, ao lado da teologia, do senso comum e da arte. As ciências são metodologicamente materialistas. Por conseguinte, a reivindicada cientificidade do marxismo deriva, legitimamente, desta observância metodológica. Mas porém, filosofia não é ciência, e tampouco, o materialismo de Marx se restringe a uma metodologia, quando ele assume seu posto de filósofo. Marx se mostra um materialista metafísico convicto e, desse modo, veste-se dos paramentos do sacerdócio ateu. Aqui, precisamente, ele deixa de ser cientista, para ser o arauto da irreligião. Por mais que ele diga que seu materialismo é distinto do de Feuerbach, estático, enquanto que o seu seria “dialético”. Marx critica a ética da sociedade burguesa, porque, em última análise, ela ainda está calcada na perspectiva de mundo cristã, e ele rejeita a teologia e tudo o que se relaciona com ela explicitamente, e nem percebe que ele inaugura uma ética nova. A ética vermelha ou ética proletária. Se Hegel, o mestre filosófico de Marx, fala em tese, antítese e síntese, o discípulo rebelde não tarda identificar a alma da relação, ainda que abstratamente, projetando estes conceitos sobre capitalistas, proletários e revolucionários. A lógica do embate e da contradição explica a tensão do mundo e a sua dinâmica. O próprio Marx diz que não é a consciência do homem que determina seu ser, mas é o seu ser social que determina sua consciência. Desprezando abertamente a psicologia, não se dá conta ele, de que ele próprio sujeita-se a processos mentais, fortemente psicológicos. O triângulo dramático de Karpman abarca perfeitamente a relação entre capitalistas, proletários e comunistas, à medida que cada uma dessas classes pode ser identificada, respectivamente, com as figuras de perseguidor, vítima e salvador. Eric Berne, o fundador da psicologia transacional, evidencia os jogos que as pessoas estabelecem ou travam entre si. E se Marx procurou ser, e em alguma medida conseguiu isto, o revelador, o que retira o véu da aparência, e exibe a essência, em sua crueza e nudez, parece que coube uma palavra final aos psicólogos. Como disse um professor meu, o reverendo Dr. Nestor Adolfo Eckert, “ainda bem que Marx não se meteu a ser psicólogo” – acenando para o fato de, o referido autor, ter seguido carreira em filosofia, sociologia, história e economia. De todo modo, se o aludido ícone intelectual alemão, renunciou a esta missão, delegando-a para os pósteros, dentre os quais obrigatoriamente devemos trazer à baila os nomes de Vygotsky, Luria, Leontiev e Bakhtin, nunca é demais lembrar que os psicólogos da linha humanista, com concentração em relações transacionais, escancaram a incompletude do tal socialismo científico, sobretudo ao evidenciar o reducionismo economicista, erro que um batalhão de outros pensadores e estudiosos também cometeram. O mês de maio é de muita luz: mês do trabalho e mês das mães. Não por nada que, a medicina descreve o aflorar de uma nova e tenra vida, como “trabalho de parto”. Com toda razão, visto que o amor sempre conduz ao trabalho, ele requer esforço.