Página Inicial | Colunistas | O trabalho “A desnecessidade de interposição de recurso para afastamento da estabilidade da tutela antecipada antecedente” do jurista Pedro Henrique Minicovski Dobrochinski

O trabalho “A desnecessidade de interposição de recurso para afastamento da estabilidade da tutela antecipada antecedente” do jurista Pedro Henrique Minicovski Dobrochinski

A previsão de tutela antecipada no direito processual civil brasileiro se acha no art. 304 do CPC.  No Superior Tribunal de Justiça, existe uma divergência interna consolidada, no que toca à necessidade ou desnecessidade de a manifestação da parte adversa realizar-se exclusivamente mediante peça cujo caráter recursal seja inquestionável. É que existe um entendimento contemporizador, […]

Por Israel Minikovsky 26 min de leitura

A previsão de tutela antecipada no direito processual civil brasileiro se acha no art. 304 do CPC.  No Superior Tribunal de Justiça, existe uma divergência interna consolidada, no que toca à necessidade ou desnecessidade de a manifestação da parte adversa realizar-se exclusivamente mediante peça cujo caráter recursal seja inquestionável. É que existe um entendimento contemporizador, noticie-se a tempo, defendido pelo monografista em comento, consoante o qual qualquer oposição à estabilização da tutela antecipada mereceria produzir os mesmos efeitos. Para patrocinar seu ponto de vista, invoca princípios como economia processual, teleologismo, sistematicidade e instrumentalidade. No bojo da discussão embarcam conceitos assessórios de grande percussão, como a possibilidade da interpretação extensiva, o que mais simplesmente pode ser chamado de generalização. Uma das qualidades da tutela antecipada é a interinidade ou provisoriedade da irradiação dos efeitos de sua concessão. A exceção a isto é a tutela satisfativa de urgência, dada a sua irreversibilidade. A estabilidade não deve ser confundida com a coisa julgada, pois a primeira se restringe à continuidade de produção de efeitos da respectiva decisão. A tutela tempestiva tem como escopo o resultado útil do processo. Concedida in limine a tutela, a parte adversa será citada para que se manifeste a respeito. Exemplificativamente, o mais corriqueiro, se a decisão emana do primeiro grau de jurisdição, é que se interponha agravo de instrumento perante o competente tribunal. Uma vez interposto o recurso pela parte adversa, o autor será intimado para aditar a preambular e, ambos, autor e parte adversa, serão intimados para audiência de conciliação e mediação. Se não houver acordo, a parte adversa apresentará, no prazo legal, a contestação. Inexistindo recurso, a decisão adquirirá estabilidade. O busílis da questão é este: alguns julgadores defendem que seria desnecessário manejar a peça recursal, podendo manifestação de outras naturezas render a suspensão dos efeitos da decisão. De acordo com o monografista, a interpretação restritiva do termo “recurso” redundaria na multiplicação de procedimentos, importando consumo de tempo e dinheiro. Por conseguinte, toda e qualquer manifestação razoável da parte adversa caracterizaria presença de oposição e, por consectário, o afastamento da inércia. A ideia seria minorar o número de atos processuais. Aqui abro uma brecha para consignar uma não desimportante consideração: uma ideia bastante defendida no direito processual, e não só no processual civil – embora sobretudo nele – senão também em todo o direito processual, é a esgotabilidade de atos processuais e das vias recursais processuais. Percutindo e esposando este entendimento, não se interporia, for instance, recurso de apelação se, antes dele, ainda coubessem embargos declaratórios. Mais do que isso, cabendo embargos declaratórios, sem interpô-los, ficaria obstado o recurso principal, em nossa hipótese, o recurso de apelação. Esta ponderação exibe de modo conspícuo de que não há um consenso de quais sejam as premissas mais basilares que devam nortear o direito processual. É certo que um processo de menor custo tem o condão de onerar menos a sociedade. Mas a seara jurídica tem seus próprios princípios e valores. Retomando a linha de argumentação, não prevalecendo a imposição da forma, restaria esmaecido o parâmetro consistente no recolhimento do preparo. A tese ventilada pelo monografista é esta, não se justifica uma forma específica para a oposição. Muito se fala da instrumentalidade do direito processual civil. Entrementes, estamos a falar da instrumentalidade do quê? A resposta é, do direito material. Admitido este axioma, a função deve curvar ou condicionar a si a estrutura. Daqui emana ou deriva a fungibilidade das formas. Permita-me, o amável leitor, perpetrar uma emenda como escólio, a ideologia contrária, o enrijecimento das formas visa a atender o fortalecimento da organização dos percursos processuais. Os formalistas se apegam a princípios como devido processo legal, ampla defesa, contraditório, duplo grau de jurisdição, para embasar seu ponto de mira. Os flexibilistas argúem que a inexigibilidade de recurso não anula nenhum destes princípios, porém é a sua realização. Os formalistas argumentam que, no âmbito judicial, o vocábulo “recurso” deve atrelar-se ao strictu sensu, o mesmo devendo ocorrer com o verbo “interpor”. Muito astutamente, alguns alegam que a dificultação da oposição pela imposição de uma formalidade legal se presta a reconhecer o valor da estabilização. No entanto, para cada ação deve-se abrir, qualquer que seja ela, uma oportunidade de contraditar, por fás ou por nefas. Outro silogismo se calca na concepção de que admitir a contestação onde deva haver agravo de instrumento é uma usurpação da competência do tribunal. A contestação serve para rebater os fatos da prodrômica, ao passo que o recurso se dirige contrariamente à decisão proferida pelo juiz da causa. Entretanto, considera o monografista que a meta não é cassar a tutela, mas apenas evitar a estabilização. Claro, a interpretação gramatical é apenas uma das interpretações possíveis, e nem sempre deve ser tida como a mais importante. Se existe alguma formalidade legal que deva ser respeitada, ela se circunscreve ao prazo. Seria mui plausível que o prazo de preclusão guardasse simetria com o prazo recursal, este da ordem de uma quinzena. O tema selecionado, além de ser profícuo em si mesmo, fornece linhas investigativas paralelas. Se em uma determinada ação o advogado não ingressa com o recurso e, já lá no STJ, a distribuição vincula o procedimento a uma turma formalista, o que impacta o feito negativamente para o interesse da parte autora, o profissional pode ser representado no órgão de classe e mesmo punido judicialmente por atecnia, isto é, por imperícia profissional? Dando por encerrado o resumo, se bem que o texto original é infinitamente melhor do que este meu, aproveito este espaço gráfico para registrar o que penso acerca deste debate, ao mesmo tempo tão teórico e tão impactante na vida das pessoas, do ponto de vista prático. Penso que a exagerada autonomia do processo resulta em processualismo. Os advogados passam a ser jogadores, e vence não quem tem o direito ao seu lado, mas quem é representado pelo melhor jogador. Os melhores jogadores cobram os honorários mais salgados e exorbitantes, que só podem ser suportados pelos clientes muito ricos. E, ao fim e ao cabo, até por força de lógica, e não por uma escolha dos magistrados, o Judiciário vem a ser estrutura burocrática para as classes sociais abastadas. O trabalho foi apresentado como TCC, um dos requisitos parciais para a obtenção do grau de Bacharel em Direito das Relações Sociais, perante a competente banca examinadora da Universidade Federal do Paraná (UFPR), sendo público e acessível no sítio da instituição.