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Origem e desenvolvimento das religiões

Toda religião surge para resolver uma magna demanda social. Com isso, não pretendo negar o aspecto transcendente das religiões, mas buscar um nexo causal palpável. Muitos noticiam que o hinduísmo é a religião mais antiga da humanidade. Um número considerável de historiadores leciona que o subcontinente indiano, em princípio, era habitado por etnias de afra […]

Por Israel Minikovsky 16 min de leitura

Toda religião surge para resolver uma magna demanda social. Com isso, não pretendo negar o aspecto transcendente das religiões, mas buscar um nexo causal palpável. Muitos noticiam que o hinduísmo é a religião mais antiga da humanidade. Um número considerável de historiadores leciona que o subcontinente indiano, em princípio, era habitado por etnias de afra origem, de pele negra, e que, em dado momento, houve a invasão e consequente dominação, pela raça ariana. Os tais arianos seriam os bárbaros citas, povo intensamente rude, egresso da região onde estaria a atual Rússia. Povo robusto, alvíssimo, ágrafo e apegado ao uso do cavalo como meio de locomoção. O hinduísmo, nessa perspectiva, teria sido elaborado para legitimar a sólida estratificação social em castas, em que o elemento estrangeiro estaria no topo. Como o conquistador era iletrado, é de se supor que intelectuais autóctones tenham vendido seus dotes escriturísticos em troca de vantagens. O judaísmo, cujo documento central é a Torá, é uma religião que gira em torno da narrativa do êxodo do povo hebreu, do Egito, para uma terra prometida por Deus, a Palestina, as regiões além do Rio Jordão. A mesma história diz respeito ao nascimento de um povo e ao de uma religião. Já o cristianismo, apresenta-se como o fastígio ou o clímax da tradição judaica. O cristianismo precipita a queda do Império Romano e toma força numa Europa decaída que mescla a cultura latina com a dos povos bárbaros. O islamismo vem ao mundo num espaço geográfico e cultural de transição. Dois super impérios, o bizantino e o persa, após reiteradas batalhas, se enfraquecem mutuamente, e inauguram um contexto receptivo à mensagem alcorânica. É interessante notar que toda grande religião se inicia com a adesão de pobres, miseráveis, doentes, prostitutas, foras-da-lei, enfim, todo tipo de população periférica. Só depois de uma relativa hegemonia é que surgem os intelectuais das respectivas tradições religiosas. Nesse sentido, Marx e Engels foram muito espertos, pois a sua nova religião, uma religião científica, seja ela, o socialismo científico, desde os primórdios foi orientada para os membros anônimos da coletividade. Nesse último caso, a demanda a ser resolvida era a assimetria de recursos econômicos. Diferentemente das religiões tradicionais, o socialismo marxiano deixava explícita a prioridade de caráter social, restringindo a espiritualidade a uma espécie de transcendência dentro dos limites da imanência, ou seja, algo, no máximo, filosófico. Dito isto, já posso invocar a teoria da cerca de Chesterton. De acordo com ela, não elimine aquelas coisas cuja finalidade lhe é desconhecida. Se, por exemplo, numa propriedade fazendária você se depara com uma cerca que separa o gado ovino do gado bovino, saiba que as ovelhas pastam, com seus dentes, a relva próxima à raiz; já a vaca usa sua língua preênsil para pascer, o que lhe fará famélica num gramado muito rente à superfície. Digo isto, porque o leitor contemporâneo desavisado poderá não compreender o sentido de ordenanças encontradiças na Torá ou no Alcorão, se não investigar a sua razão histórica de ser. Tenho visto que muitas destas regras foram expedidas com o fito de abolir costumes pagãos politeístas que, além de não encontrarem amparo racional algum, prejudicavam a vida das pessoas. No mundo da inteligência artificial, grandes empresas tiram da rede certos programas, e abrem canais de manifestação para que, mediante as próprias queixas dos usuários, se deduza a finalidade do aplicativo. Com tudo isso, persigo lograr a convicção do meu amável leitor, de que, em política, ainda não se fez o devido balanço da experiência prática e da valia teórica da literatura apelidada de “pensamento crítico”. Se tradições religiosas milenares continuam em voga, ainda que estejamos diante de uma fecunda criação mirabolante como é o socialismo científico, penso que é demasiado cedo encerrar o expediente dos debates respeitantes ao seu alcance heurístico, dada sua aplicabilidade prática, como gestão ou como crítica. Sempre há uma moral social nestes grandes sistemas de pensamento. Se o mundo vai mal, em que pese as muitas tradições religiosas, sem elas, nossa espécie já teria sucumbido. Temos muito o que ler, sobre o que estudar e refletir. Desligue os eletrônicos e leia os clássicos, você não verá luz de led, mas luz de verdade!