Os aspectos nebulosos da Reforma Tributária
O sistema tributário brasileiro é caótico, labiríntico e disfuncional
Por O Brasil como nos parece 25 min de leitura
Jorge Amaro Bastos Alves*
O Brasil precisa de uma reforma tributária sem dúvidas, haja vista que, o sistema tributário brasileiro é caótico, labiríntico e disfuncional. Nesse ponto a reforma é positiva, dado que, extingue uma série de tributos.
Mas, alguns pontos dessa PEC 45/19 da reforma tributária são um tanto quanto nebulosos. Embora aprovada na Câmara dos Deputados, não significa que o texto seja bom, na realidade existem diversos aspectos ruins e mal explicados. Atualmente existem cinco tributos sobre o consumo que serão extintos, o IPI, PIS e COFINS da União, o estadual ICMS e o municipal ISS, e substituídos pelo Imposto sobre Valor Agregado (IVA).
Como no Brasil existe uma divisão de competências tributárias entre os entes da federação, que aliás é um dos principais elementos do pacto federativo, esse IVA foi batizado como dual e dividido em dois tributos: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) de competência da União e os estados e municípios ficam com o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), ambos com uma alíquota fixa, ainda não estipulada.
O que me causa uma certa inquietação nessa eterna discussão tributária, é que ela se arrasta há cerca de três décadas, inclusive tendo sido uma das bandeiras do ex-ministro Paulo Guedes. Agora de forma açodada foi colocada para votação de forma intempestiva pelo presidente da Câmara. Ora, um assunto dessa magnitude que impactará toda a sociedade e o sistema econômico produtivo do país deveria ser amplamente discutido em vários fóruns e entidades de classes.
De modo igual, outros pontos preocupantes permeiam essa reforma tributária. A rigor não se está debatendo a redução da enorme carga tributária que existe no país, mas, apenas em simplificação; claro que isso não deixa de ser positivo. Igualmente, o anseio de se acabar com a chamada “guerra fiscal” entre estados e também entre municípios é outro assunto crítico e intrincado. Ocorre que na atualidade, o que se tem é uma competição tributária por meio de incentivos fiscais, como redução de impostos, visando atrair empresas e investimentos para suas regiões.
Portanto, caso essa reforma seja aprovada nos termos propostos, isso poderia desafiar a estrutura atual do pacto federativo brasileiro, pois, o sistema tributário brasileiro e o pacto federativo estão intimamente relacionados. Isto posto, a consequência imediata é que a repartição de recursos seria gravemente afetada devido a que os entes subnacionais perderiam a autonomia de gerir competências tributárias. Por consequência, o poder ficaria ainda mais centraliza na esfera federal, ou seja, teremos “Mais Brasília e menos Brasil”!
Entre os prós da competição tributária destacam-se a atração de investimentos que impulsionam o desenvolvimento econômico e geram empregos. Igualmente, existe um estímulo à inovação, posto que, a concorrência entre os estados pode incentivar a busca por soluções criativas e inovadoras para atrair investimentos, levando a avanços tecnológicos e desenvolvimento de setores estratégicos. De fato, se a competição entre estados e municípios for eliminada, as empresas tendem a se estabelecer em locais que oferecem melhores condições de infraestrutura, capital humano desenvolvido e outros fatores que podem incluir acesso a mercados, fornecedores, mão-de-obra qualificada, centros de pesquisa e desenvolvimento, entre outros.
Portanto, regiões menos desenvolvidas podem enfrentar desafios em atrair investimentos se não puderem competir por meio de benefícios fiscais e outros incentivos, haja vista que possuem menos recursos para investir em infraestrutura e desenvolvimento.
Essa é outra matéria que traz mais inquietações. Como não haverá mais competição entre os entes subnacionais, o governo criará um Fundo de Desenvolvimento Regional para financiar projetos de desenvolvimento em estados mais pobres. Primeiro, os critérios para a divisão dos recursos do fundo entre os estados serão definidos após a reforma. Segundo, provavelmente será o governo quem dará a palavra final para alocação dessas verbas.
Ora, a história mostra que o governo é um péssimo administrador, gasta mais do que arrecada. Além disso, utiliza mecanismos oportunistas em suas relações, como a política de alianças entre os poderes executivos e legislativo baseada no fisiologismo. Aliás, o atual governo é especialista nisso, visto que num passado recente exerceu o poder por meio do fisiologismo do Mensalão e do Petrolão, dois grandes esquemas de corrupção, por meio de desvios de dinheiro público. Esse “toma-lá, dá cá”, combinado com o aliciamento de parlamentares, por meio de liberação de emendas parlamentares continua resultando em mais algazarra com o dinheiro público. Na véspera da votação da reforma tributária, o governo empenhou R$ 5,3 bilhões em emendas Pix, dinheiro que entra no caixa das prefeituras sem a obrigatoriedade de apresentação de projetos específicos.
Como a fiscalização dessas verbas é feita por tribunais locais, normalmente repletos de parentes nomeados pelos políticos, faz com que esse cenário seja bem ilustrado pelo ditado popular “nada é tão ruim que não possa piorar”.
Diante disso, é razoável afirmar que o futuro do sistema tributário brasileiro guarda estreita relação com o aforismo dito nos anos 1830 pelo político e ministro das finanças da França, Barão Joseph Dominique Louis: “Dai me boa política e eu vos darei boas finanças”. Mas, infelizmente, o povo brasileiro, de forma geral, não tem dado bons políticos para a nação!
*Economista e Professor do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional da Universidade do Contestado – UNC. jb.alves@protonmail.com