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Teorias da Consciência e Descriminalização do Aborto

Continua sub judice, aos cuidados dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, o reconhecimento da (in)constitucionalidade da interrupção voluntária da gravidez até 12 semanas (aborto). Juridicamente, as principais teses giram em torno de conceitos como: início da vida, direitos reprodutivos, saúde pública, proporcionalidade, autodeterminação, diálogo interinstitucional, dentre outros. Científica e filosoficamente, não há consenso a respeito […]

Por Israel Minikovsky 15 min de leitura

Continua sub judice, aos cuidados dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, o reconhecimento da (in)constitucionalidade da interrupção voluntária da gravidez até 12 semanas (aborto). Juridicamente, as principais teses giram em torno de conceitos como: início da vida, direitos reprodutivos, saúde pública, proporcionalidade, autodeterminação, diálogo interinstitucional, dentre outros. Científica e filosoficamente, não há consenso a respeito de quando principia a subjetividade do ser humano em processo de gestação. Uns relacionam o início do psiquismo ao desenvolvimento do tubo neural. Bem, não sou cientista, sou filósofo. Não é de hoje que os filósofos discutem o que é a consciência, e como ela funciona. Temos duas grandes teorias na atualidade em choque. São elas, respectivamente: “Teoria da informação integrada” e “Teoria do espaço de trabalho global”. A primeira mencionada teoria defende que temos consciência das coisas pelo cérebro, e que ele reproduz relações encontráveis em outras instâncias. Explico melhor: os sistemas que integram e são integrados estabelecem um resultado de funcionalidade. E esse propósito não atende a exigências de caráter ontológico ou lógico. A rigor não existe matéria “bruta”. Mesmo numa pedra, o que há é uma rede de átomos e moléculas, em que se agitam prótons e elétrons. A consciência que temos das coisas, na realidade, são as próprias coisas, são as leis da matéria. E essa consciência não é prerrogativa nossa. Nosso gato de estimação tem a consciência dele, variando o grau ou a qualidade. Bem, se esta tese estiver correta, então o feto teria já uma consciência, antes mesmo do menor resquício de aparição e desenvolvimento do sistema nervoso central. Se tornarmos a dignidade dependente da consciência, com o principal surge o acessório. Vedado, resulta, pois, o aborto, dado que ele estaria maculando o aspecto sagrado das coisas, que é a consciência. A conclusão é paradoxal, dado que essa teoria banaliza a consciência. Nessa abordagem, a própria internet seria uma espécie de consciência, credora dos mesmos direitos inalienáveis, antes extensíveis apenas aos humanos. Concorrendo com esta teoria, existe a Teoria do espaço de trabalho global. Para ela, o nosso cérebro seria como uma inteligência artificial, em que um espaço aberto e acessível, o “quadro negro”, funcionaria como um dado que chama bancos de memórias, em que diferentes programas de computador podem funcionar. Por meio deste artifício, as memórias inconscientes se tornam conscientes. No caso dessa segunda teoria, não fica bem claro a relação que deveríamos estabelecer com o aborto. De todo modo, nesse viés, a consciência se torna esparsa, não sendo possível identificar com precisão que natureza de ser é consciente e qual não no é. Relativizado o parâmetro, por força de coerência, relativizam-se as discussões que se ancoram sobre ele. Desde que a filosofia existe ela tem dado respostas provisórias e sempre problemáticas. Ninguém fica sem dormir porque os problemas filosóficos se perpetuam no berço da irresolução. O que ocorre é que o senso de justiça apela, agora, para a riqueza da meditação filosófica, e se depara com a frustração. E o efeito prático dessa ausência se afere na interrupção de vidas humanas. Uma vez aprovado o aborto, teremos menos indivíduos circulando. É uma responsabilidade ética e moral para a genitora, para o profissional que realiza o procedimento, e para o Colegiado de Magistrados. Como obsecrou o magistrado catarinense João Alfredo Medeiros Viana, “Julga-me como Deus. Eu julguei como homem”. Prevendo situações dessa natureza, Paulo teria nos aconselhado: “…Não ambicioneis coisas altas, mas acomodai-vos com as humildes…” (Romanos 12, 16). Não há salomônica, ou mantém-se a criminalização ou se descriminaliza. Sem meios termos ou modulação de efeitos. As Igrejas Cristãs, ou que assim se autodenominam, em sua quase totalidade, reprovam o aborto. Parece ser a orientação mais correta e concorde com o ensino do Mestre Jesus “Eu vim para que todos tenham vida, e a tenham em abundância”. Vida é luz!