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XIV Conferência Municipal de Assistência Social

Em 29 de junho de 2023, no Centro Social da Paróquia Puríssimo Coração de Maria, das 8h às 16h30min, ocorreu a XIV Conferência Municipal de Assistência Social, do Município de São Bento do Sul. Antes dos trabalhos, foi ofertado um reforçado café da manhã. Composta a mesa cerimonial, fizeram uso da palavra as autoridades dela […]

Por Israel Minikovsky 49 min de leitura

Em 29 de junho de 2023, no Centro Social da Paróquia Puríssimo Coração de Maria, das 8h às 16h30min, ocorreu a XIV Conferência Municipal de Assistência Social, do Município de São Bento do Sul. Antes dos trabalhos, foi ofertado um reforçado café da manhã. Composta a mesa cerimonial, fizeram uso da palavra as autoridades dela integrantes. A presidente do Conselho Municipal de Assistência Social, Taís Spézia, ressaltou a relevância dos trabalhos do conselho, bem como o momento da conferência. O secretário municipal de assistência social, Gilmar Luis Pollum, pontuou que em torno de 90% dos recursos para financiamento das políticas sociais, em São Bento do Sul, partem do erário municipal. Neste sentido, segundo ele, precisamos criar estratégias para acessar as verbas encontradiças em fundos estaduais e federais. A vereadora Zuleica Maria Sousa Voltolini disse que, dentre todas as pastas municipais, a secretaria de assistência é a que “tem maior coração”. Noutros termos, gizou a universalidade da oferta do serviço. E completou: “nós, políticos, temos que correr atrás desses recursos”. O prefeito Antônio Joaquim Tomazini Filho parabenizou “este grande evento”. Disse que “daqui sairá opinião, voz, boas ideias, e soluções”. Apelou para o apoio da comunidade: “ajudem o governo a ajudá-los”. Capitaneando o atual time de gestores, arrematou: “nosso maior intuito é melhorar a qualidade de vida de vocês”. Tivemos a apresentação cultural do Grupo Folclórico Germânico Escola de Educação Básica São Bento, fundado em 22 de abril de 1988. Tendo sido declarada aberta a conferência por Taís Spézia, pudemos dedicar a atenção ao motivo para o qual nos concentramos no lugar, data e horário referidos. O regimento interno da conferência foi aprovado no momento da inscrição eletrônica, pois a mesma não poderia ser perpetrada sem a leitura e aval do aludido documento. Passamos à oitiva da fala do palestrante, o Sr. David Tiago Cardoso. O referido aulista é mestre (2018) e doutorando em psicologia, na área de psicologia social e cultura, pela Universidade Federal de Santa Catarina, pesquisador no grupo de pesquisa MARGENS: modo de vida, família e relações de gênero, possui graduação em psicologia pela Universidade do Vale do Itajaí (2006). Psicólogo no Sistema Único de Assistência Social do Município de Balneário Camboriú, Santa Catarina. Professor na Universidade do Vale do Itajaí no curso de psicologia. Consultor na área de Políticas Públicas e Demandas Familiares em Contexto de Vulnerabilidade e Risco Social. A palestra teve como tema “Reconstrução do SUAS: o SUAS que temos e o SUAS que queremos”. O palestrante precaveu a plateia de que, além de ser técnico da assistência social do CREAS, no seu Município, além de ser professor universitário, é gente, pessoa. Casado, pai de duas filhas, uma de 6 anos e outra de 20. Tem um pet de estimação, uma cachorra. Relatou que o local de residência de sua família, quando criança, era o litoral, mas que o pai trabalhava em Mafra. A figura paterna era alvanel. Quando o genitor saía para trabalhar, dizia ao filho (in casu, o palestrante), aos tenros 5 anos de idade, “você é o homem da casa”. Com esses relatos pessoais e familiares, o conteudista quis dizer que, nós homens, somos condicionados a prover e proteger, o que não é exatamente o mesmo que cuidar, tarefa esta, atribuída às mulheres. Temos que flexibilizar nossa comunicação, consoante o perfil de quem ouve. É por isso que nos abaixamos para falar com crianças. Não porque nos tornamos crianças, mas para que ela se sinta valorizada. É pelo diálogo que se transmite segurança. No diálogo se firma o certo e o errado. E essa referência se traduz em cuidado e zelo. Como observou o professor, é natural que, nós homens, joguemos futebol aos trinta ou quarenta anos de idade. Como fazíamos quando éramos meninos. Mas as mulheres da mesma idade não brincam de boneca. Simplesmente, porque, no lugar das bonecas, estão os filhos. As bonecas, de certo modo, transformaram-se em sujeitos, em pessoas. No que se refere ao eixo 1, de acordo com a fala professoral, o dinheiro não é desimportante na medida em que se mostra como a verba que financia os serviços para os usuários, senão ainda, se mostra como o recurso que assegura remuneração digna para os trabalhadores do SUAS. Não é, simplesmente, uma política “de mulheres para mulheres”, mas uma política “com mulheres”, e não só. Jamais podemos perder de vista as garantias afiançadas, como a certeza do acolhimento e da autonomia dos sujeitos. À guisa de recapitulação, Paulo Freire teve um pensamento citado, expresso na assertiva que segue: “A democracia no Brasil foi construída de cima para baixo, precisamos construí-la em outros termos”. Nosso desafio não consiste apenas em proteger direitos, contudo, além disso, em criar novos direitos. Exemplificativamente, pensemos numa pessoa deficiente, cujos pais falecem. Não seria caso de internamento, mas de Centro-Dia. O preletor, que trabalha na equipe de medidas socioeducativas, trouxe a letra de uma música que expressa o sentimento e o desejo do público adolescente:

Gente quer comer

Gente quer ser feliz

Gente quer respirar pelo nariz

Não, meu nego, não traia nunca essa força não

Essa força que mora em seu coração

(Caetano Veloso)

A mensagem da canção teria o mérito de destacar a função da emoção em nossas relações existenciais. Nossa sociedade teria sido construída calcada na racionalidade, mas não deu muito certo. Além da lógica, é preciso construir afeto. Objetivando transmitir a ideia de responsabilidade e esforço que deve ser a diagonal que atravessa nosso ser social e laboral, o painelista rememorou ter saído de sua casa, em Itajaí, às 4 horas da madrugada. Ele disse que o SUAS é, ou deveria ser, o lugar onde se encontra “gente que gosta de gente”. Ele lamenta a necessidade fatual de ter havido um documento de diretriz chamado “Humaniza SUS” (fazendo analogia entre saúde e assistência social). Não queremos um “Humaniza SUAS”, queremos que a assistência social seja o que ela deve ser, um “cuidar de pessoas em relação”. Nós, técnicos do SUAS, não “solucionamos”, mas “cuidamos”. Como SUAS, nós temos alguns desafios. Três dos maiores deles: 1) Tomar a cautela de que a política em apreço não seja estigmatizada como, simplesmente, algo de mulher para mulher, porém, que a política referida seja compreendida como cuidado social; 2) Evitar o padrão filantrópico ou fisiológico, baseado na troca. Verbum gratia: desatrelar a concessão do benefício eventual à participação no grupo. A pessoa precisa participar do grupo porque ele cumpre um propósito positivo, e não para satisfazer um requisito de entrega de algo; 3) Ser sistema, isto é, devemos promover a integração. Dentro do próprio SUAS e com os demais parceiros da rede de proteção. Ideias ou conceitos como o de hierarquia devem sua existência à necessidade de compreensão conceitual no viés de fluxograma. Nenhum profissional é maior do que outro. O usuário não é do CRAS ou do CREAS, ele é da assistência social. Mais que sermos “técnicos” ou “referências”, objetivos ambiciosos nas duas situações, precisamos cuidar de pessoas. Todos partilhamos o mesmo entorno. Quando cuidamos de adolescentes, ditos “infratores”, estamos cuidando de nossa própria família. Ele, uma vez reintegrado, não vai saquear a casa em que habitamos. Feitas as considerações, de acordo com seleção prévia, cada um se dirigiu às salas onde seriam discutidos os temas de cada eixo. Tivemos cinco eixos: 1) Eixo 1 – financiamento: financiamento e orçamento de natureza obrigatória, como instrumento para uma gestão de compromisso e responsabilidades dos entes federativos para garantia dos direitos socioassistenciais contemplando as especificidades regionais do país; 2) Eixo 2 – controle social: qualificação e estruturação das instâncias de controle social com diretrizes democráticas e participativas; 3) Eixo 3 – articulação entre os segmentos: como potencializar a participação social no SUAS?; 4) Eixo 4 – serviços, programas e projetos: universalização do acesso e a integração das ofertas dos serviços e direitos no SUAS; 5) Eixo 5 – benefício e transferência de renda: a importância dos benefícios socioassistenciais e o direito à garantia de renda como proteção social na reconfiguração do SUAS. Eu fui integrante do eixo 1. Este eixo teve como facilitadora Maria do Amaral, e como relatora, Carolina Backes. A primeira profissional, veterana no funcionalismo público municipal, atua na área contábil, enquanto a segunda vem a ser auxiliar administrativa, que labora na gestão de Rh na assistência social. O grupo foi informado de que, em nossa Constituição Federal, existe um percentual mínimo a ser direcionado para a área da saúde, igual a 15% da receita, o mesmo ocorrendo em relação à educação, em que o percentil corresponde a 25%. Entretanto, não existe dispositivo constitucional análogo para a área da assistência social. Foi explicado que o orçamento público é um instrumento de planejamento. Ele traça a linha de equilíbrio e as prioridades. É uma previsão, sem querer dizer, ao menos, que o dinheiro efetivamente existe. Um exemplo de uso de verba orçamentária para fins concretos na área de assistência social foi a reforma do CRAS do Bairro Vila Centenário. Houve não só reforma, mas ainda ampliação dos espaços. Em nível federal, a Lei de Diretrizes Orçamentárias e a Lei Orçamentária Anual precisam da aprovação do Congresso Nacional e da sanção do Presidente da República. Ainda explanando conceitos comezinhos à esfera de atuação pública em comento, foi esclarecido que o recurso é a receita adquirida pela arrecadação de impostos. Já as despesas são gastos necessários para a execução dos serviços. Foram exibidas algumas planilhas, como os recursos recebidos do Estado, distribuídos entre proteção básica, média, alta, benefícios eventuais, incentivo à gestão municipal, total, ao longo dos anos de 2019 a 2023, cuja fonte para averiguação tem como endereço virtual a página do FEAS – Fundo Estadual de Assistência Social. São exemplos de benefícios eventuais o cartão alimentação e o fornecimento de passagens. O cartão alimentação veio a substituir a cesta básica. Um importante documento apresentado aos participantes do eixo foi o Relatório Saldo Dotação, relativo à execução orçamentária do período de 2018 até junho de 2023. No passado a verba repassada desconsiderava o tamanho do Município e os serviços ofertados. No que pertine aos recursos recebidos da União, tivemos uma panorâmica de 2019 a 2023, cujos dados foram extraídos da página do Ministério da Cidadania. Em virtude da pandemia Covid-19, foram geradas novas demandas. E, por conta delas, em 2020, veio um valor um pouco maior. O Governo Federal, até agora, mandou valores irrisórios para os Municípios. No entanto, a causa disso não é política. A ocorrência deve sua existência a fatores de ordem estritamente técnica. Do portal da transparência foi extraído um relatório de despesas, do período 2019 a 2023, e ali se pôde ver que o Município tem um repasse (do Estado e União) em milhares, sendo as despesas em milhões. Está em tramitação a PEC 383/2017, de autoria de Danilo Cabral, do PSB/PE, apresentada em 09/11/201, cuja ementa consiste em “recurso mínimo para financiamento do SUAS”. Quem quiser acompanhar a tramitação pode visitar o sítio da Câmara Federal. A situação da proposta: Pronta para pauta no plenário (PLEN). A ideia seria que, no mínimo, esse percentual ficasse na casa do 1%, muito embora outros falem em 3%. Marisa disse que, às vezes, não necessariamente em São Bento do Sul, o Governo Federal deixa de enviar verba pelo não uso das já enviadas. Assim sendo, sempre quando vem verba para o Município ela deve ser usada. A não aplicação gera a presunção de não necessidade. É preciso otimizar a verba, tendo o zelo de não gastar de qualquer jeito. “O dinheiro é como energia, ele não pode ficar parado, tem que movimentar”, pontuou a facilitadora. Após a elaboração das propostas, que teriam que atender ao critério “ao menos uma para o Município, uma para o Estado e uma para a União”, totalizando “no máximo 5 propostas por eixo”, fomos ao refeitório, dado que o ponteiro do relógio batia meio-dia. Muitas saladas, a maioria delas verde, arroz carreteiro e suco natural nos aguardava. Às 13 horas retomamos os trabalhos. Foram submetidas à votação da plenária as propostas elaboradas nos eixos. Perfectibilizada a votação das propostas, votamos as moções e, alfim, elegemos os delegados para nos representarem na Conferência Estadual de Assistência Social. Passava bastante das 16h quando demos conta de cumprir as tarefas que nos foram confiadas e que deveriam ter logrado êxito no encontro. Ficamos felizes sobretudo pela participação dos usuários, bem como pelo engajamento de todos os atores sociais, servidores públicos, sociedade civil organizada, autoridades, comunidade em geral. São estes momentos que vivificam o direito, fomentam a cidadania, expressam o alcance de nossa democracia, e faz com que nos sintamos aquilo para o que viemos a este mundo, sermos pessoas, sujeitos históricos, ambulantes que sofrem e são felizes. Luz!